O PRINCÍPIO BÁSICO DA CONVIVÊNCIA HUMANA: O RESPEITO
Leandro A. Rodrigues
Quando meus gêmeos eram bebês, a fim de estabelecer limites em relação ao espaço de cada um, criei um aforismo de convivência em nossa casa: o princípio básico da convivência humana é o respeito. Assim, utilizando tal máxima, sem perceber, ensinei-lhes uma regra para a vida, ou seja, independente de sexo, raça, cor, posição social/profissional, crença, escolha política e futebolística, SEMPRE, o respeito deve pautar o nosso viver, a nossa conduta.
Após o incidente com o ônibus da delegação do São Paulo no sábado, dia 23 de janeiro, ao ver as cenas de brutalidade, em meu interior, apenas pensei: o princípio básico da convivência humana está em falta no mundo.
No dia seguinte, domingo, 24 de janeiro, após a vitória do Tricolor das Laranjeiras sobre o Time da Estrela Solitária, o atacante Wellington Silva, após marcar o gol de pênalti, chorou e, diante das câmeras, desabafou. Falou acerca da perseguição que tem sofrido dos torcedores do seu clube, por intermédio das redes (anti?) sociais. Novamente, pensei: está em falta na prateleira do comércio humano o princípio básico.
O futebol é, talvez, um dos esportes que mais mexa com as emoções humanas. Somos apaixonados pelo nosso clube, alçando-os à condição de nação e, muitas vezes, até, chegando próximo de algo semelhante à religião. Deixar-se envolver pela emoção não pode ser confundido com a ausência total de respeito e, principalmente, fazer com que, com a desculpa mentirosa de tudo pelo amor do clube, sejam acobertados crimes que fogem à lógica da sociedade e que atentam contra a vida de outrem. Novamente, penso, baixinho, em meu interior: nada disso aconteceria se o princípio básico da convivência humana estivesse sendo colocado em prática.
Não se pode esquecer que jogador de futebol é um ser humano, como nós, repleto de sentimentos, de sonhos. É um ser humano que possui família, entes queridos e, como nos ensinou o italiano Arrigo Sacchi: “É a coisa mais importante dentre as coisas menos importantes”. O jogador de futebol é um profissional que vive do futebol. Para ele, não se trata apenas de um jogo e/ou de um campeonato. É a maneira de ele sustentar a sua família. Como sempre digo: há professores descompromissados, há jornalistas mentirosos, há políticos falsos, há pessoas ruins em todas as profissões. E, do mesmo modo, também, há
jogadores que não se envolvem com deveriam em sua profissão. No entanto, nada no mundo justifica uma agressão, uma coação, um linchamento sumário de um profissional.
Em abril de 2019, durante o jogo VASCO e BANGU, pelo Carioca (já mencionei esse jogo na crônica “ Paixão não se explica”), tive a honra e o privilégio de conhecer, pessoalmente, o Márcio, goleiro que começou nos juvenis do Vasco em 1986 e, profissionalmente, defendeu as cores do Gigante da Colina de 1991 até 2004. Lembro-me bem de que ele, inclusive, foi o goleiro que mais atuou durante a conquista do Campeonato Brasileiro de 1997. Conhecemo-nos por acaso, nas cadeiras do Maracanã, quando me sentei na fileira anterior à que ele estava. Assim como eu, Márcio estava com a sua família. Foi extremamente simpático conosco. Tiramos fotos (algumas, inclusive, ilustram esta coluna), trocamos contato e, desde então, constantemente, falamo-nos pelo whatsapp. Durante o jogo, enquanto trocávamos impressões acerca da partida, ficava claro em minha mente o quanto o torcedor se esquece de que o jogador é um ser humano normal como o próprio torcedor. Não se trata de um super homem ou de alguém frio, gelado, sem sentimento. Eu estava ali, perto de alguém que participara dos momentos áureos do meu time do coração. De alguém que, como jogador, conquistou cinco (1992, 1993, 1994, 1998 e 2003) Estaduais (sendo quatro Taças Guanabara [1992, 1994, 1998 e 2000] e quatro Taças Rio[1992, 1993, 1999 e 2001]), dois Brasileiros (1997 e 2000), uma Libertadores (1998), uma Mercosul (2000), um Rio-São Paulo (1999), um Cidade de Zaragoza (1993), um Cidade de Barcelona (1993) e um Torneio João Havelange (1993). No entanto, ao longo do jogo, ele estava ali, assim como eu, sofrendo e lamentando com os lances errados, comemorando efusivamente os gols e, consequentemente, a vitória vascaína naquela tarde quente de outono carioca. Tudo isso, porque antes de ser jogador, Márcio é um ser humano, com limites, fraquezas e virtudes.
Creio que, talvez, seja importante, neste momento tão conturbado da humanidade, ressaltarmos que jogadores de futebol e membros da comissão técnica, antes de serem atletas e profissionais do futebol, são seres humanos com sentimentos, brios e que, além de representarem as cores de uma agremiação, quando entram em campo, representam, principalmente, a si mesmo e aos seus pais, às suas mães, aos seus irmãos, às suas esposas, aos seus filhos, às suas filhas, enfim, aos seus familiares e aos seus amigos. Portanto, para desempenharem bem o papel que se espera deles, têm a necessidade de receberem o princípio básico da convivência humana: o respeito.
Saudações Vascaínas!