“NÃO É APENAS FUTEBOL”
Leandro A. Rodrigues
Às vezes, perguntam-me de onde vem a minha loucura pelo Vasco da Gama, pelo futebol em si. Já expliquei, aqui mesmo, neste espaço, na crônica “Paixão não se explica”, que, racionalmente, não há argumentos que validem o motivo pelo qual amo o futebol e, consequentemente, o Gigante da Colina.
Olhando para o meu presente e para o meu passado, percebo que há muitas coisas envolvidas em torno do futebol. Não me refiro apenas à adrenalina que envolve o jogo em si. Refiro-me a algo que transcende o prazer momentâneo da partida. Vejo o futebol como um grande unificador de ideologias e agregador de diferenças.
Quando criança, havia o momento, na escola, da nossa “recreação” e, ali, havia a junção de turmas para a prática esportiva. Sempre escolhíamos o futebol. Assim, surgia a amizade com outros meninos que não estudavam na mesma sala. E, quando víamos, a amizade se estendia ao recreio e, muitas vezes, fora dos limites da escola.
Em meu bairro, ainda na infância, em nossa rua, fizemos o nosso time de futebol: o “P2” (abreviação de Posto 2, complemento de identificação da localidade em que morávamos). Fazíamos amistosos contra os times das outras ruas e, constantemente, havia o clássico contra o time do “BNH”, moradores do Conjunto Habitacional da outra margem do Rio Piabanha. Depois, com uma outra versão do “P2”, disputamos o campeonato de bairros no Esporte Clube Corrêas e chegamos a ser campeões do Torneio do Bom Clima. Tínhamos entre 10 e 13 anos. Sem perceber, ali, naquele instante, o futebol unia-nos com uma força absurda. Éramos meninos de diversas classes sociais, diferentes raças, distintas religiões e, invariavelmente, torcíamos para times não semelhantes. No entanto, pelo futebol, todos ficávamos juntos. Bastava uma única coisa: gostar de futebol. Não importava mais nada. Bastava uma bola e a boa disposição para correr atrás dela.
Depois, disputei, por alguns clubes da cidade (Corrêas, Cascatinha, Cruzeiro do Sul, Boa Esperança, Santa Isabel e Vera Cruz), alguns campeonatos de futebol. Fiz grandes e incontáveis amigos em jogos, torneios e competições, assim como, durante a minha vida escolar, o momento das olimpíadas era um aglutinador que não exigia as afinidades cotidianas para que permanecêssemos no mesmo grupo, passou a ocorrer, também, em cada grupo de pelada que vim a participar.
Com o passar do tempo, pude testemunhar o mesmo fenômeno a ocorrer com os meus gêmeos. Percebi que se trata de uma reação atemporal do “velho esporte bretão”. Em virtude disso, passei a, juntamente com os meus filhos, fazer amizade com os pais das outras crianças assim como com os integrantes da comissão técnica. Mais uma vez, o futebol estava a integrar, a unir.
No entanto, um dos momentos mais ricos que o futebol me proporcionou, foi quando tinha por volta dos 16 anos de idade. Meus amigos e eu formamos um time inesquecível: o “DOENÇA F.C.”. O nome era uma homenagem a um amigo, que vivia a chamar a todos de “Doença” e, também, por termos uma “doença” em comum: o futebol. Alguns dos jogadores tinham feito parte das versões anteriores do “P2”, como o Marcelo, o nosso zagueiro-zagueiro; Beto, o nosso jogador piadista; Adiel, o craque da equipe; Léo, o gordinho com a melhor visão de jogo que já vi; e, algumas vezes, Guto, o rápido atacante que não fugia de nenhuma confusão. Houve, ainda, a aquisição de três peças novas e fundamentais à equipe: Fabiano, o homenageado, cujo vício de chamar a todos de Doença inspirou-nos a batizar o time; Fábio, o destemido chutador; e, por fim, Banana, o nosso “coringa”, que tanto podia ser goleiro quanto zagueiro. Assim, alugamos um horário semanal em uma quadra, em nosso bairro e, aos sábados, das 15h00min às 16h00min, agendávamos jogos contra diversas equipes. Ficamos juntos durante quatro anos. Conseguimos resultados assombrosos, tanto positiva quanto negativamente, mas o melhor de tudo, passamos a ter histórias inesquecíveis e, até hoje, continuamos amigos e, algumas vezes, conseguimos nos reencontrar, agora, com a presença de nossos filhos, esposas e até netos, para nos confraternizarmos. Em nossos encontros, falamos sobre tudo, lembramo-nos de jogadas, de lances, de momentos inesquecíveis. Quase que, diariamente, em nosso grupo de whatsapp, conversamos. Lá, comemoramos as realizações uns dos outros, estamos à par das dores e das dificuldades cotidianas de cada um e, principalmente, zoamo-nos, sempre, por causa da nossa grande “doença”,
o futebol.
Somos, hoje, nove homens de meia-idade que trilharam caminhos profissionais distintos e fizeram escolhas pessoais completamente diferentes, pois nunca houve, entre nós, nenhum tipo de unanimidade; porém, a bola uniu-nos e realizou a composição perfeita.
Todas as vezes que o toque personalizado do nosso grupo indica a chegada de uma nova mensagem em meu telefone, penso na importância do futebol para sedimentar e dar as bases da nossa amizade e, em meu íntimo, repito a frase de um comercial antigo: “Não é apenas futebol”. Na verdade, nunca foi apenas futebol.
Saudações Vascaínas!